794ceedb99cf (340x196, 25Kb)

7.2.10

Teus olhos de dendém


Para a M. J.

Naquela noite eu disse
lá em casa
que ia prò cinema.

Cruzei a Baixa toda
entrei numa boate
– a mais fina de Luanda –
e fui dançar com ela
apaixonadamente.

Ela era uma pequena
de Malange.

Tinha nos olhos
brilhantes como incêndios ao luar
o claro escuro
dos bagos
de um cacho de dendém.

Naquela noite
dançámos loucamente
apaixonadamente.

Tinha a pele clara
como qualquer daquelas
mulheres que eu conheci
nas longas noites invernais
da Europa.

Mas o olhar
ai
o olhar
trazia o sofrimento
das noites Africanas.

Nunca mais pude esquecer
aquela rapariga branca
de Malange
que tinha os olhos lindos
como as cores
dos bagos
de um cacho de dendém.

Nunca mais
ai, nunca mais
dancei assim
e nunca mais a vi
dançar assim
tão loucamente
alucinadamente
a rapariguinha branca de Malange
que tinha o corpo esguio
o ritmo no bailar
esse ritmo de uma qualquer mulata
das minhas longas noites Africanas.

Nunca mais dancei assim
tão desvairadamente
apaixonadamente
os lábios num murmúrio
a boca num perjúrio
seus seios no meu peito
amachucadamente
aqueles cabelos negros
roçando a minha face
os cílios desse olhar
com gotas de luar
que tinha as ambições
o claro escuro
dos bagos
de um cacho de dendém.

Nunca mais
ai, nunca mais
dancei assim
tão loucamente
apaixonadamente...

Ernesto Lara Filho
Angola